quinta-feira, dezembro 10, 2009

BREVE ESTUDOS SOBRE AS BEM-AVENTURANÇAS DO SERMÃO DO MONTE – MATEUS 5 .1-12

PARTE I

Quem dentre nós, cristãos, não conhece ou nunca ouviu falar do mais famoso pronunciamento de Jesus, o Sermão do Monte? Um discurso em palavras simples mas com idéias tão profundas, cujas riquezas são inesgotáveis. Certamente, idéias e riquezas também inalcançáveis a pessoas que porventura estejam distantes da graça de nosso Pai.

Vamos enveredar por esta mensagem tão sublime e beber desta fonte que jorra águas vivas, para que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo (Ef 4:13).

"1 Vendo Jesus as multidões, subiu ao monte, e, como se assentasse, aproximaram-se os seus discípulos; 2 e ele passou a ensiná-los, dizendo:
3 Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus.

4 Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados.

5 Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra.

6 Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão fartos.

7 Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.

8 Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão a Deus.

9 Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.

10 Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus.

11 Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos injuriarem, e vos perseguirem, e, mentindo, disserem todo mal contra vós.

12 Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes de vós".

Antes de fazermos qualquer consideração sobre as bem-aventuranças, precisamos responder à três perguntas: (1) Quem são as pessoas descritas? (2) Quais as qualidades recomendadas a essas pessoas? (3) Quais as bênçãos prometidas?

1. Quem são as pessoas descritas?

As bem-aventuranças descrevem o caráter equilibrado e diversificado do povo cristão. Não existe uma bem-aventurança para cada grupo distinto entre os discípulos de Jesus, ou seja, um grupo dos mansos, outro dos misericordiosos e outro dos que choram, por exemplo. Antes, são as bem-aventuranças oito qualidades do mesmo grupo de pessoas, que ao mesmo tempo, são mansas e misericordiosas, humildes de espírito e limpas de coração, choram e têm fome, são pacificadoras e perseguidas.

Um grupo que exibe esses sinais está longe de ser uma aristocracia espiritual e elitista distante dos demais membros da igreja. Diferente dos dons espirituais que o Espírito Santo distribui de forma variada entre os membros da igreja, as bem-aventuranças são como os frutos do Espírito Santo que são devidos a todos os cristãos, que devem zelosamente buscá-los e vivê-los. As bem-aventuranças descrevem o caráter ideal para cada um dos que tem a Jesus Cristo como Senhor de sua vida.

2. Quais são as qualidades recomendadas a essas pessoas?

Comparando as bem-aventuranças em Mateus e Lucas notamos algumas diferenças. Em Lucas está escrito: “Bem-aventurados vós os pobres”, enquanto que Mateus declara: “Bem-aventurados os humildes (pobres) de espírito”. Em Lucas temos: “Bem-aventurados vós os que agora tendes fome”, e em Mateus: “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça”.

Com relação a isto, alguns argumentam que a versão de Lucas é a verdadeira; que Jesus estava julgando os pobres e os famintos do ponto de vista social ou sociológico; que ele estava prometendo alimento aos subnutridos e ao proletariado no reino de Deus; e que Mateus espiritualizou o que constituía originalmente uma promessa material.

Essa interpretação é impossível, pois estaríamos dizendo que Jesus estava contradizendo os evangelistas que ele mesmo preparou. Na tentação do deserto da Judéia, Jesus recusou-se a transformar pedras em pão e repudiou a idéia de estabelecer um reino material. Isso aconteceu durante todo o seu ministério. Ao alimentar os cinco mil, com pães e peixes, a multidão quis proclamá-lo rei e Ele imediatamente se retirou sozinho para o monte. Quando Pilatos perguntou se ele era, ou desejava ser, rei dos judeus sua resposta foi: “O meu reino não é deste mundo”. Isto é, tinha uma origem diferente e, portanto, caráter diferente.

Jesus não se negava a alimentar o faminto, nem de socorrer o oprimido, Ele jamais foi indiferente às mazelas que suportamos nessa vida, porém, as bênçãos de seu reino não são primeiramente uma vantagem econômica. Jesus nunca disse que em seu nome teríamos alívio físico imediato, apesar de sabermos que Ele pode fazê-lo se isto estiver dentro de seus planos e propósitos para nós, nem disse que seríamos lançados de imediato ao céu, tampouco ficava afirmando que os famintos e os pobres eram “bem-aventurados”. Na verdade, em algumas circunstâncias, Deus pode usar a pobreza como instrumento de bênção espiritual, exatamente como a riqueza pode ser um impedimento à mesma. Mas isso não transforma a pobreza num ideal cristão, desejado por Jesus.

A igreja não pode fechar os olhos ante a miséria e a fome das massas, mas também não deve crer que pessoas que fazem voto de pobreza e renúncia total a bens materiais mereçam algum louvor.

A pobreza e a fome a que Jesus se refere nas bem-aventuranças são condições espirituais. São os “humildes (pobres) de espírito” e aqueles que “têm fome e sede de justiça” que ele declara bem-aventurados. Assim todas as outras bem-aventuranças referem-se a qualidades espirituais, de pessoas que tem firmada a sua fé e esperança em Deus.

3. Quais são as bênçãos prometidas?

A Bíblia na Linguagem de Hoje em sua tradução afirma no lugar de “Bem-aventurados”,

“Felizes os pobres...”. Isso representa-nos um erro porque a felicidade é um estado muito subjetivo. Nas bem-aventuranças vimos que Jesus está julgando objetivamente os “Bem-aventurados”. Ele não está declarando como se sentirão (“felizes”), mas sim o que Deus pensa delas e o que são por causa disso: são “bem-aventuradas”.

Que bênção é essa? A segunda parte de cada bem-aventurança elucida a questão. Possuem o reino dos céus e herdarão a terra. Os que choram são consolados e os famintos satisfeitos. Recebem a misericórdia, vêem a Deus, são chamados filhos de Deus. Sua recompensa celestial é grande. E todas estas bênçãos estão reunidas. Exatamente como as oito qualidades descrevem cada cristão (pelo menos em ideal), da mesma forma as oito bênçãos são concedidas a cada cristão. É verdade que a bênção específica prometida em cada caso é apropriada à qualidade particularmente mencionada. Ao mesmo tempo, é totalmente impossível herdar o reino dos céus sem herdar a terra, ser consolado sem ser satisfeito ou ver a Deus sem alcançar sua misericórdia e ser chamado seu filho. As oito qualidades juntas constituem as responsabilidades; e as oito bênçãos, os privilégios, a condição de cidadão do reino de Deus. Este é o significado do desfrutar do governo de Deus.

Estas bênçãos são para o presente ou para o futuro? Devemos crer que são tanto para o presente quanto para o futuro. Mesmo que a segunda parte pareça ter uma natureza escatológica (futura) e que a segunda parte da última bem-aventurança também refira-se a uma bênção futura, nos céus, é muito claro par aos cristãos fiéis que o reino de Deus é uma realidade presente que podemos “receber”, “herdar” ou “entrar” agora. Do mesmo modo, podemos alcançar misericórdia e consolo agora, podemos nos tornar filhos de Deus agora e podemos, nesta vida, ter a nossa fome satisfeita e a nossa sede mitigada. Jesus prometeu todas estas bênçãos a seus discípulos aqui e agora. A promessa de que “verão Deus” pode parecer uma referência à “visão beatífica” final, e sem dúvida a inclui. Mas nós já começamos a ver Deus nesta vida, na pessoa do seu Cristo e com a visão espiritual. Já começamos a “herdar a terra” nesta vida, considerando que , se somos de Cristo, todas as coisas já são nossas, “seja o mundo, seja a vida, seja a morte, sejam as cousas presentes, sejam as futuras” (I Co 3.22,23).

Outro problema que devemos enfrentar é que as bem-aventuranças, aparentemente, ensinam uma doutrina de salvação pelos méritos humanos. Seria isso verdade?

Alguns intérpretes tentam apresentar o Sermão do Monte como nada mais que uma débil forma cristianizada da lei do Velho Testamento e da ética do Judaísmo. Prega a lei, não o evangelho, e oferece justiça pelas obras e não pela fé.

Apesar de tantas especulações, na verdade, a primeira das bem-aventuranças proclama a salvação pela graça e não pelas obras, pois ela promete o reino de Deus aos “humildes de espírito”, isto é, às pessoas que são tão pobres espiritualmente que nada têm a oferecer para mérito seu.

Não pode haver dúvidas de que o Sermão do Monte tem, sobre muitas pessoas, o primeiro efeito já notado. Quando o lêem, ficam desesperadas. Vêem nele um ideal inatingível. Como poderiam desenvolver essa justiça de coração, voltar a outra face, amar os seus inimigos? É impossível! Exatamente! Neste sentido, o Sermão é “Moisíssimo Moisés” (expressão de Lutero); “é Moisés quadruplicado, é Moisés multiplicado ao mais alto grau, porque é uma lei de justiça interior a que nenhum filho de Adão jamais poderia obedecer. Portanto, apenas nos condena e torna indispensável o perdão de Deus, em Cristo. Não poderíamos dizer que esta é uma parte do propósito do Sermão? É verdade que Jesus não o disse explicitamente, embora esteja na primeira bem-aventurança. Mas a implicação está em toda a nova lei, exatamente como no antiga.

O segundo propósito do Sermão é descrito por Lutero: “Cristo nada diz neste Sermão sobre como nos tornamos cristãos, mas apenas sobre as obras e os frutos que ninguém pode produzir se já não for um cristão e não estiver em estado de graça. Todo o sermão pressupõe uma aceitação do evangelho, uma experiência de conversão e de novo nascimento, e a habitação do Espírito Santo. Descreve as pessoas nascidas de novo que os cristãos são (ou deveriam ser). Portanto, as bem-aventuranças apresentam as bênçãos que Deus concede (não como uma recompensa aos méritos, mas como um dom da graça) àqueles nos quais ele está desenvolvendo um caráter assim.

Resumindo estes três pontos introdutórios relacionados com as bem-aventuranças, podemos dizer que as pessoas descritas são de modo geral os discípulos cristãos, pelo menos em ideal; que as qualidades elogiadas são qualidades espirituais; e que as bênçãos prometidas (como dons da graça imerecida) são as bênçãos gloriosamente compreendidas pelo governo de Deus, experimentadas agora e consumadas depois, incluindo a herança de ambos, terra e céu, consolo, satisfação e misericórdia, visão e filiação de Deus.