Para falar da importância do Ensino Religioso nas escolas do Brasil, não podemos deixar de citar o acordo entre Igreja e Estado, em que o ato foi assinado por ocasião da audiência privada do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o Papa Bento XVI, no Vaticano, no dia 13 de novembro de 2008. Tal acordo é relativo ao estatuto jurídico da Igreja Católica no Brasil e, relativo ao que interessa para este escrito, lê-se no Artigo 11:
“A República Federativa do Brasil, em observância ao direito de liberdade religiosa, da diversidade cultural e da pluralidade confessional do País, respeita a importância do ensino religioso em vista da formação integral da pessoa.
§1º. O ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e as outras leis vigentes, sem qualquer forma de discriminação”1.
Apesar da laicidade constitucionalmente declarada do Estado, não se pode evitar a unilateralidade de algumas atitudes políticas no Brasil — mas, deixando de lado essas mazelas — o ensino religioso aqui deve ter uma proposta ecumênica, pelo menos em tese. Com práticas educacionais que viabilizem o exercício da tolerância e o respeito à diversidade, principalmente porque o lugar da escola pública permite a reunião de diversas representações de fé. Aqueles que são favoráveis a esta disciplina, não devem pretender fazer da sala de aula um lugar de proselitismo, mas um espaço privilegiado de reflexão sobre direitos, deveres e fraternidade. Isto implica a necessidade de se construir uma pedagogia que favoreça tal perspectiva, porque o seu objetivo é fruto de experiências pessoais, de incansáveis buscas de respostas para questões existenciais: “as religiões são parte importante da memória cultural e do desenvolvimento histórico de todas as sociedades. Desse modo, ensinar religiões (e não uma religião) na Escola não deve ser feito para defesa de uma delas, em detrimento de outras, mas discutindo-se princípios, valores, diferenças e tendo em vista – sempre – a compreensão do outro.”2
É o que afirma a Constituição Federal promulgada em 1987/1988. Onde se dizia que: “O Ensino Religioso ocupa-se com a educação integral do ser humano, com seus valores e suas aspirações mais profundas. Este ensino quer cultivar no ser humano as razões mais íntimas e transcendentais, fortalecendo nele o caráter de cidadão, desenvolvendo seu espírito de participação, oferecendo critérios para a segurança de seus juízos e aprofundando as motivações para a autêntica cidadania.” Diante de uma sociedade cada vez mais materialista e utilitarista, onde o indivíduo tem mais importância pelo que tem e não pelo que é, onde a intolerância e o fundamentalismo ocupam espaços midiáticos e são totalmente acessíveis virtualmente com o advento da internet, como podemos relegar a uma situação de menor importância uma disciplina como esta? Justamente por ser tão importante, o ensino religioso deve ser trabalhado como um conteúdo de saber e deve também passar por uma rigorosa avaliação. Principalmente num país de decisões tão tendenciosas, unilaterais e ambíguas quanto o Brasil.
De suma importância é que a escola não pode abandonar sua natureza: “A escola é uma instituição social que tem, entre outras características, a promoção da formação e da informação dos alunos. Não pode fugir à sua vocação específica de instituição social que busca o desenvolvimento pleno de todas as crianças, visando primordialmente sua socialização. O ensino religioso faz parte deste elenco, principalmente se entendermos a educação inserida numa cultura e a religião como um dos elementos da cultura”3. Mesmo que alguém, chegando à idade adulta, resolva abandonar a fé de sua infância, ou mesmo que na adolescência deixe para trás os ensinamentos, a sua personalidade poderá ser mais ampla em sua construção pelo que recebeu no ensino religioso.
Enfim, o Ensino Religioso, para afirmar sua relevância deve ajudar o indivíduo a criar uma consciência crítica em relação à dimensão religiosa da vida e da compreensão dos fenômenos religiosos nas suas mais diversas manifestações. Permitindo que as pessoas possam compreender-se como seres religiosos e que vivenciem uma religiosidade saudável, inteligente e madura. Tendo no educador alguém que se perceba como um ser religioso para dialogar com os outros e respeitar esta dimensão humana em seu fazer educativo. Numa escola que mantenha sua vocação específica de instituição social, para a formação de cidadãos e cidadãs cada vez mais humanizados, preocupados com a vida, com o outro e com o meio-ambiente.
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1 Itamaty, Ministério das Relações Exteriores, Assessoria de Imprensa do Gabinete, Nota nº 637, de 13 de novembro de 2008.
2 MOURA, Eliane e KARNAL, Leandro (Leitura Crítica: Paulo Miceli). O ensino religioso na escola pública, São Paulo, Universidade Estadual de Campinas, no 1, p. 8.
3 ENSINO RELIGIOSO NO DESENVOLVIMENTO INTEGRAL DA PESSOA, Maria Judith Sucupira da Costa Lins, Professora adjunta da Faculdade de Educação da UFRJ - http://www.educacao.ufrj.br/revista/indice/numero2/artigos/mjudith.pdf, 26/06/09.