sexta-feira, junho 26, 2009

A IMPORTÂNCIA DO ENSINO RELIGIOSO



Para falar da importância do Ensino Religioso nas escolas do Brasil, não podemos deixar de citar o acordo entre Igreja e Estado, em que o ato foi assinado por ocasião da audiência privada do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o Papa Bento XVI, no Vaticano, no dia 13 de novembro de 2008. Tal acordo é relativo ao estatuto jurídico da Igreja Católica no Brasil e, relativo ao que interessa para este escrito, lê-se no Artigo 11:

“A República Federativa do Brasil, em observância ao direito de liberdade religiosa, da diversidade cultural e da pluralidade confessional do País, respeita a importância do ensino religioso em vista da formação integral da pessoa.
§1º. O ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e as outras leis vigentes, sem qualquer forma de discriminação”1.

Apesar da laicidade constitucionalmente declarada do Estado, não se pode evitar a unilateralidade de algumas atitudes políticas no Brasil — mas, deixando de lado essas mazelas — o ensino religioso aqui deve ter uma proposta ecumênica, pelo menos em tese. Com práticas educacionais que viabilizem o exercício da tolerância e o respeito à diversidade, principalmente porque o lugar da escola pública permite a reunião de diversas representações de fé. Aqueles que são favoráveis a esta disciplina, não devem pretender fazer da sala de aula um lugar de proselitismo, mas um espaço privilegiado de reflexão sobre direitos, deveres e fraternidade. Isto implica a necessidade de se construir uma pedagogia que favoreça tal perspectiva, porque o seu objetivo é fruto de experiências pessoais, de incansáveis buscas de respostas para questões existenciais: “as religiões são parte importante da memória cultural e do desenvolvimento histórico de todas as sociedades. Desse modo, ensinar religiões (e não uma religião) na Escola não deve ser feito para defesa de uma delas, em detrimento de outras, mas discutindo-se princípios, valores, diferenças e tendo em vista – sempre – a compreensão do outro.”2

É o que afirma a Constituição Federal promulgada em 1987/1988. Onde se dizia que: “O Ensino Religioso ocupa-se com a educação integral do ser humano, com seus valores e suas aspirações mais profundas. Este ensino quer cultivar no ser humano as razões mais íntimas e transcendentais, fortalecendo nele o caráter de cidadão, desenvolvendo seu espírito de participação, oferecendo critérios para a segurança de seus juízos e aprofundando as motivações para a autêntica cidadania.” Diante de uma sociedade cada vez mais materialista e utilitarista, onde o indivíduo tem mais importância pelo que tem e não pelo que é, onde a intolerância e o fundamentalismo ocupam espaços midiáticos e são totalmente acessíveis virtualmente com o advento da internet, como podemos relegar a uma situação de menor importância uma disciplina como esta? Justamente por ser tão importante, o ensino religioso deve ser trabalhado como um conteúdo de saber e deve também passar por uma rigorosa avaliação. Principalmente num país de decisões tão tendenciosas, unilaterais e ambíguas quanto o Brasil.

De suma importância é que a escola não pode abandonar sua natureza: “A escola é uma instituição social que tem, entre outras características, a promoção da formação e da informação dos alunos. Não pode fugir à sua vocação específica de instituição social que busca o desenvolvimento pleno de todas as crianças, visando primordialmente sua socialização. O ensino religioso faz parte deste elenco, principalmente se entendermos a educação inserida numa cultura e a religião como um dos elementos da cultura”3. Mesmo que alguém, chegando à idade adulta, resolva abandonar a fé de sua infância, ou mesmo que na adolescência deixe para trás os ensinamentos, a sua personalidade poderá ser mais ampla em sua construção pelo que recebeu no ensino religioso.

Enfim, o Ensino Religioso, para afirmar sua relevância deve ajudar o indivíduo a criar uma consciência crítica em relação à dimensão religiosa da vida e da compreensão dos fenômenos religiosos nas suas mais diversas manifestações. Permitindo que as pessoas possam compreender-se como seres religiosos e que vivenciem uma religiosidade saudável, inteligente e madura. Tendo no educador alguém que se perceba como um ser religioso para dialogar com os outros e respeitar esta dimensão humana em seu fazer educativo. Numa escola que mantenha sua vocação específica de instituição social, para a formação de cidadãos e cidadãs cada vez mais humanizados, preocupados com a vida, com o outro e com o meio-ambiente.

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1 Itamaty, Ministério das Relações Exteriores, Assessoria de Imprensa do Gabinete, Nota nº 637, de 13 de novembro de 2008.
2 MOURA, Eliane e KARNAL, Leandro (Leitura Crítica: Paulo Miceli). O ensino religioso na escola pública, São Paulo, Universidade Estadual de Campinas, no 1, p. 8.
3 ENSINO RELIGIOSO NO DESENVOLVIMENTO INTEGRAL DA PESSOA, Maria Judith Sucupira da Costa Lins, Professora adjunta da Faculdade de Educação da UFRJ - http://www.educacao.ufrj.br/revista/indice/numero2/artigos/mjudith.pdf, 26/06/09.


terça-feira, junho 23, 2009

Teologia da "Revelação"?

“Revelação não é um conceito especificamente cristão nem um conceito teológico”. Na linguagem bíblica, ele não tem uma importância central. A teologia apologética da Idade Média e do Iluminismo incipiente foi que deslocou a “revelação” para o centro das atenções como fundamento da teologia cristã, para delimitar o conhecimento especificamente cristão de Deus em relação ao conhecimento racional acessível a todos e dar-lhe ênfase própria. Mas, desse modo, acabou retirando-o da discussão geral, pois não se pode discutir sobre as “revelações divinas”. Estas se possui ou não se possui. A teologia cristã falou de “revelação” sempre apenas em contraposição à “razão” humana. Contudo o correlato da fé cristã é, de acordo com a noção dos reformadores, a promissão de Deus “Fides ET promissio sunt correlativa [Fé e promissão são correlatas]”. Com a promissão de Deus tem-se em mente o conteúdo básico das tradições bíblicas. Elas testemunham a história da promissão de Deus. (...) Na história humana, Deus “revela-se” por meio da concordância entre promissão e cumprimento, pois nessa concordância a sua “fidelidade” torna-se manifesta e sua fidelidade é a sua essência. Deus indentifica-se com as suas promissões e por meio delas demonstra ser o Deus confiável, constante e fidedigno. “Deus é fiel e não pode negar a si mesmo” (II Tm 2.13). A ressurreição do Cristo crucificado é, conforme o Novo Testamento, a prova escatológica da fidelidade de Deus que nem mesmo a morte é capaz de invalidar. É por isso que com a ressurreição de Cristo tem início a revelação da glória de Deus, que vencerá o poder do tempo juntamente com o poder da morte e estabelecerá a criação eterna. [Experiências de reflexão teológica. Caminhos e formas da teologia cristã. Petrópolis: Vozes, 2000, pp. 71, 72].

Jürgen Moltmann
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Este é um excelente tema para se começar uma discução a respeito da interpretação acumulativa da Bíblia, - no sentido de construção de teologias sistemáticas - onde as doutrinas protestantes repousam sem uma classificação de textos diversos que, normalmente, nem sempre afirmam as mesmas coisas. Por exemplo, o dízimo nos livros do Êxodo, Levítico e Deuteronômio tem uma destinação diferente, entretanto, a teologia sistemática, em vez de classificar os textos de acordo com quem os escreveu (sacerdotal, da corte, profético, etc), acumula tais textos e força uma dogmática frágilizada e que, nos dias de hoje, me parece muito capenga. Há muito trabalho a ser feito com relação à quebra de paradigmas que, por serem considerados imutáveis devido seu caráter "divinamente inspirado", tem se perpetuado inclusive em seus erros de interpretação.

Pr. Luciano Costa

segunda-feira, junho 22, 2009

Demônio começou carreira como 'agente secreto' de Deus, diz pesquisador

Texto para incitar a pesquisa. Divirta-se!
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Personagem é 'chefe do FBI' de Javé em livros do Antigo Testamento.Para estudioso americano, papel continua valendo na Bíblia cristã.

Reinaldo José Lopes Do G1, em São Paulo

Visão tradicional da queda de Lúcifer desenhada pelo ilustrador Gustave Doré no século 19 (Foto: Reprodução)

Qualquer cristão com um mínimo de formação religiosa é capaz de fazer um breve resumo da carreira do Diabo: originalmente um anjo poderoso, ele teria se rebelado contra Deus no princípio dos tempos, induzido Adão e Eva a cometer o chamado pecado original e, ainda hoje, estaria pronto a induzir a humanidade a fazer o mal, manipulando tudo e todos nos bastidores. O problema, afirma um livro que acaba de chegar ao Brasil, é que essa trama básica não estaria em lugar nenhum da Bíblia, mas teria sido

montada por teólogos cristãos dos séculos 3 e 4, responsáveis por uma leitura um bocado criativa das Escrituras. Segundo essa visão, o Satanás bíblico não seria um rebelde contra Deus, mas uma espécie de "agente secreto" ou "chefe do FBI" divino, responsável por testar a lealdade dos seres humanos.

A tese polêmica está em "Satã - uma biografia" (Editora Globo), escrito por Henry Ansgar Kelly, professor emérito da Universidade da Califórnia em Los Angeles e autor de outros livros sobre a figura literária do Demônio. Kelly vai além da maioria dos outros estudiosos modernos da Bíblia, os quais, como ele, afirmam que as poucas aparições de Satanás no Antigo Testamento se referem a uma figura que é subordinada a Deus, e não inimiga do Criador. Para Kelly, no entanto, a situação não muda substancialmente nas menções ao Maligno no Novo Testamento.

"O Satã no Novo Testamento deve ser percebido como tendo uma posição equivalente a um Primeiro-Ministro, ou um Procurador-Geral da República, ou diretor do FBI, e não mais diabólico do que muitos dos mais zelosos representantes dessas posições aqui na Terra", escreve o pesquisador. A visão geral expressa nos Evangelhos e nos outros livros bíblicos do começo do cristianismo, segundo o autor, é que Satanás simplesmente toma gosto excessivo por suas funções de testador da humanidade, e por isso perde as boas graças de Deus, sendo expulso do Céu.

Problemas de nomenclatura

Antes de chegar a esse ponto, porém, Kelly tenta entender as primeiras aparições do personagem no Antigo Testamento, as quais são um bocado complicadas por problemas de nomenclatura. É que a palavra hebraica satan e seu equivalente aramaico satanah (o aramaico, é bom lembrar, era a língua provavelmente usada por Jesus no dia-a-dia) podem simplesmente funcionar como um substantivo comum, que significa algo como "adversário".

"Adversário" de quem, a propósito? Um dos poucos exemplos em que "o satã" (e não Satã/Satanás, como nome próprio) aparece na Bíblia hebraica é o livro de Jó. Nesse livro bíblico, um humano de altas qualidades morais e comportamento correto, o Jó do título, perde sua família, seus bens e sua saúde por instigação "do satã", que sugere a Deus um teste para a fé de Jó.

"No livro de Jó, 'o satã' é simplesmente um membro do Conselho Divino, um dos servos de Deus cuja função é investigar os acontecimentos na Terra e agir como uma espécie de promotor, trazendo os malfeitores à justiça", explica Christine Hayes, professora de estudos clássicos judaicos da Universidade Yale (EUA). "Quando Javé se gaba de seu piedoso servo Jó, o anjo-promotor simplesmente pergunta, seguindo sua função, se a fé de Jó é sincera", diz ela. Em algumas traduções da Bíblia, em vez de ser designado como "Satã", esse personagem é simplesmente chamado de "o Adversário". Aparentemente, ele é visto pelo autor anônimo do livro de Jó como um dos "filhos de Deus" -- expressão que se refere aos anjos que formam a corte divina.

Manuscrito medieval retrata o Diabo com tintas grotescas (Foto: Reprodução)

No livro do profeta Zacarias, também no Antigo Testamento, a figura de Satã (que também pode ser traduzido como "o Acusador") reaparece, desta vez questionando diante de Deus a boa-fé o sumo sacerdote judeu Josué. Enquanto Satã funciona como promotor público, um outro anjo é o advogado de defesa, que consegue a absolvição do sumo sacerdote. As aparições satânicas na Bíblia hebraica se restringem a essas passagens -- a serpente que induz Eva e Adão a comerem o fruto proibido no livro do Gênesis nunca é explicitamente identificada com Satã.

Licença para tentar

A situação e a personalidade do Diabo (palavra de origem grega cuja etimologia é a mesma do hebraico satan) mudam no Novo Testamento? A interpretação tradicional é que sim, mas Kelly tenta demonstrar que esse dado não é tão seguro quanto parece.

Primeiro, os Evangelhos e outros livros da parte cristã da Bíblia mostrariam que Deus delegou a Satanás a missão de testar a lealdade e a fé dos seres humanos, permitindo que ele tentasse Jesus no deserto ou levasse os apóstolos a fraquejar em seu apoio ao Messias. Isso também explicaria o costume de chamar o Maligno de "Príncipe deste mundo" -- um poder delegado por Deus ao Tentador enquanto o plano divino não chegasse ao fim. Também não é traçada relação direta entre a serpente do Paraíso e Satanás pelos autores bíblicos cristãos, nem mesmo por Paulo, que traça um elo entre o pecado de Adão e a salvação trazida por Jesus.

Em sua análise do livro do Apocalipse, Kelly afirma que a última parte dessa drama cósmico é a "demissão" de Satanás de seu papel de acusador na corte de justiça divina. No capítulo 12 do livro, lê-se: "Foi precipitado o acusador de nossos irmãos, que os acusava, dia e noite, diante de nosso Deus". Essa visão é apresentada como uma profecia para o futuro, de forma que a chamada queda de Satanás e dos anjos que o seguem não poderia ter acontecido antes da criação do mundo.

"Os fatos são incontornáveis: Satã permaneceu em sua posição como o Acusador Celestial dos humanos desde os tempos da visão de Jó e Zacarias. Ele tem continuado a exercer essa função desde o presente e continuará no futuro, adicionando cristãos à sua lista de acusados. Mas ele se excede em suas acusações, com o resultado previsto de que não haverá mais lugar para ele nos Céus", escreve Kelly.

Nasce Lúcifer

Se essa é a interpretação correta dos dados sobre Satanás na Bíblia, de onde veio a história sobre a rebelião do anjo Lúcifer? Muito provavelmente da leitura que mestres dos primeiros séculos do cristianismo, como Orígenes de Alexandria (que viveu entre os anos 185 e 254 d.C.), fizeram da Bíblia, afirma Kelly.

O nome Lúcifer, ou "Portador da Luz", é só uma adaptação para o latim de Helel ben Shahar, ou "o Brilhante, filho da Aurora", termo poético usado pelo profeta Isaías no Antigo Testamento para se referir ao rei da Babilônia. Orígenes e outros pensadores cristãos, no entanto, interpretaram a passagem como uma referência à rebelião e à queda de um anjo poderoso, que teria se revoltado contra Deus por orgulho e, como vingança, levado Adão e Eva a pecar.

sexta-feira, junho 05, 2009

Citação

"Com certeza, ele é europeu; mas a teologia européia deve deixar de ser apresentada eurocentricamente. com certeza, ele é um homem; mas a teologia deve deixar de ser apresentada androcentricamente. Com certeza, ele vive no 'Primeiro Mundo'; mas a teologia que ele desenvolve não pode ser o reflexo dos pontos de vista dos dominadores. ele deseja, acima de tudo, contribuir para que a voz dos oprimidos seja ouvida. O conceito de 'contribuições para a teologia' visa a indicar a sua pensão do absolutismo tácito e preconcebido das idéias particulares de um contexto" [Experiências de reflexão teológica. Caminhos e formas da teologia cristã. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 12].

Jürgen Moltmann